Bailes, carros alegóricos e ‘blocos sujos’: entenda como a construção da EFMM deu início ao Carnaval em Porto Velho

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Festividade surgiu dos movimentos dos trabalhadores envolvidos na construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré. Em 2024, mais de 20 blocos devem desfilar pelas ruas da capital, do dia 2 ao dia 17 de fevereiro. História do Carnaval em Porto Velho
Rita Vieira/Acervo
O Baile Municipal, que acontece no sábado (20), abre alas para o período de folia mais esperado por muitos moradores de Porto Velho: o Carnaval.
Historiadores ouvidos pelo g1 revelam que foi durante a construção do maior patrimônio histórico da cidade, a Estrada de Ferro Madeira Mamoré (EFMM), que a festividade começou na capital rondoniense.
Foi a partir do movimento dos trabalhadores, com o ‘Desfile de Mascarados’, que festividade começou e evoluiu ao longo do tempo para os atuais e tradicionais blocos de rua.
Este ano, mais de 20 blocos devem desfilar pelas ruas da capital, do dia 2 ao dia 17 de fevereiro.
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Trabalhadores x Elite
De acordo com a pesquisadora e historiadora Rita Vieira, as primeiras manifestações carnavalescas surgiram em Porto Velho durante a construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré (EFMM), entre 1900 e 1912.
🔧 🩺 Naquela época, a cidade era dividida entre: trabalhadores (mão de obra) e elite (engenheiros, médicos e empresários).
As celebrações passaram a ser organizadas por essas pequenas populações consideradas ‘elitistas’, em locais como o Clube Internacional (atualmente conhecido como ‘Ferroviário’), e em vários outros “bordeis.
Os trabalhadores, ao observar as festas promovidas pela ‘elite’, sentiram o interesse de festejar também. A partir disso, surgiram as primeiras manifestações populares nas ruas, onde as pessoas se vestiam com cores vibrantes, fantasias e máscaras nos desfiles carnavalescos.
Primeiros desfiles carnavalescos realizados nas ruas da capital rondoniense
Rita Vieira/Acervo
De acordo com o professor e historiador da Universidade Federal de Rondônia (Unir), Marco Teixeira, foi durante a ditadura Vargas, em 1930, que as práticas carnavalescas, vistas como ‘imorais’ em todo o país, passaram a ser ‘disciplinadas’.
“Foi inevitável que, após a ditadura, o Carnaval ganhasse novamente fortes contornos populares e de liberação corporal e mental’, explica.
Após o período da ditadura, o Carnaval popular, como o ‘Bloco de Mascarados’, voltaram a tomar conta das ruas. Os bailes de salão, organizados pela elite, readquiriram suas características originais e surgiram vários outros clubes na cidade, como o ‘Ipiranga’ e o ‘Garfo de Ouro’.
Carnaval de rua na avenida Farquar na década de 80 em Porto Velho
Rita Vieira/Acervo
Escolas de samba e os ‘blocos sujos’
Influenciada pelo estilo carioca, surgiu em Porto Velho, em 1958, a escola de samba Grêmio Recreativo ‘Os Diplomatas do Samba’, que representava funcionários públicos e ferroviários.
Da esquerda para a direita está Jair Monteiro (atual presidente da diplomatas), Cabeleira (1° mestre sala de Rondônia), Carlinhos Maracanã (Carnavalesco e ativista social) e vestida de vermelho está Sílvia (ex-rainha do Carnaval em Porto Velho)
Rita Vieira/Acervo
Na mesma época, as rodas de samba e danças de terreiro também se tornaram comum nas periferias da cidade, que se formavam nos arredores dos bairros planejados da capital.
Segundo Marco, nesses bairros populares, os ‘Blocos Sujo’ e outros grupos começaram a organizar cortejos pela cidade. O primeiro registro é do bloco ‘O Triângulo Não Morreu’. Em seguida, surgiram outros, como o ‘Bloco da Cobra’, no bairro mocambo.
Escola de samba O Triângulo Não Morreu – Adulto
Livro ‘História do Carnaval em Porto Velho’
Nesse período, as figuras marcantes do carnaval eram a Dona Labibi Bartolo, Bola Sete (Eliezer Santos) – fundador do bloco ‘Deixa Falar’, que evoluiu para a primeira escola de samba exclusivamente masculina da cidade.
“Pouco tempo depois, a força dos Diplomatas do Samba levou à união da escola ‘Deixa Falar’ e do bloco ‘Triângulo Não Morreu’ à escola de samba”, explica o historiador.
Competições das escolas de samba
Com as cores vermelha e branca, os Diplomatas do Samba dominaram todos os títulos do carnaval de rua de Porto Velho. A hegemonia foi desde a sua fundação até 1970, quando surgiu uma escola ‘rival’, explicam os historiadores.
Em 1964, após o desfile da Diplomatas, moradores do bairro Caiari formaram a escola ‘Os Pobres do Caiari’, satirizando suas condições financeiras.
Manchete de jornal sobre a vitória da escola de samba ‘os pobres do caiari’ em Porto Velho
Rita Vieira/Acervo
Marco Teixeira explica que esse evento e o surgimento de outras escolas, marcou o ápice dos desfiles de samba em Porto Velho, entre o final dos anos 60 e o início dos anos 90.
As competições entre as escolas passaram a ocorrer em diferentes avenidas da cidade, após o período de 7 de setembro.
Notícia de jornal impresso com a ordem dos desfiles de escolas de samba em 1985
Rita Vieira/Acervo
Em 1971, surgiu também um novo ‘bloco de sujos’, formado por funcionários da antiga usina de asfalto localizada no bairro da Embratel, que decidiram realizar um desfile improvisado após concluírem o recapeamento de uma avenida.
Considerados pelo público do carnaval como sucesso, decidiram continuar o desfile por anos seguintes, até oficializarem a criação da entidade com o nome de ‘Escola de Samba Asfaltão’, em homenagem ao piche de asfalto em que trabalhavam no dia em que tudo começou.
‘Na brincadeira entra quem quiser’
De acordo com o professor, a decadência do Carnaval de rua teve início nos anos 90, com o surgimento de eventos pagos, como o Carnaval na Praça. A insegurança gerou a busca por blocos mantidos por cordas de isolamento e com mais seguranças.
“Apesar desse declínio, a Banda do Vai Quem Quer, fundada em 1981, manteve-se como um evento de rua acessível a todas as classes sociais, desfilando nos sábados de carnaval até hoje”, explica.
Em 1981, um grupo de amigos boêmios e apaixonados pela cultura discutia os problemas dos carnavais na capital. Assim, nasceu a ‘Banda do Vai Quem Quer’. Entre os amigos, estava Manoel Mendonça, o Manelão, que ficou conhecido como o “General da Banda”.
Segundo Silvio Santos, um dos fundadores do bloco carnavalesco, a Banda surge como uma espécie de protesto sob inspiração de um bloco carioca. A ideia deu tão certo que a Banda, hoje, é patrimônio cultural do estado.
Banda do Vai Quem Quer – foliões encaram chuva para curtir carnaval em Porto Velho em 2023
Jaíne Quele Cruz/g1
Além disso, outros blocos surgiram para desfilar em dias específicos na semana carnavalescas e animar o período de festividades, como o ‘Galo da Meia-Noite’ do bairro do Caíari e ‘Pirarucu do Madeira’ dos bairros Arigolândia e o Caíari.
Conhecido pelas cores, os bonecos gigantes, fantasias e ausência de cordas e abadás, em 2023, o bloco ‘Pirarucu do Madeira’ se tornou Patrimônio Cultural de Porto Velho.
Pirarucu do Madeira arrasta multidões durante Carnaval em Porto Velho
João Antônio Alves