Prostituta durante 25 anos, Brenda Myers-Powell já foi até esfaqueada.

Em depoimento à BBC de Londres, ela conta os dramas que viveu durante os 25 anos de prostituição.
Brenda-Myers-Powell (Foto: Getty Images)

Brenda Myers-Powell é uma ex-prostituta de Chicago e também co-fundadora e diretora executiva da Dreamcatcher Foundation, uma ONG que luta pra acabar com o tráfico humano na sua cidade natal. Ela esteve no mundo daprostituição durante 25 anos.

Brenda enfrentou muitas dificuldades em sua vida desde muito cedo. Sua mãe, que a teve enquanto ainda era adolescente, morreu aos 16 anos e, como Brenda ainda era muito pequena, nunca descobriu a causa certa da morte. “A explicação oficial era a de que tinha sido por ‘causas naturais’. Mas eu não acredito. Quem morre aos 16 anos de causas naturais?”, desabafa ela, que foi criada pela avó desde então.

A relação com a sua vó, que embora se esforçasse pra ser uma boa avó, era um tanto quanto conturbada, já que ela tinha problemas com a bebida e muitas vezes levava seus parceiros de bar pra casa. “Depois que estava bêbada e desmaiada, esses homens faziam coisas comigo”, revela Brenda.

Esta situação não aconteceu poucas vezes e Brenda acredita que a avó nunca tenha tomado conhecimento. “Isso começou quando eu tinha uns 4 ou 5 anos e depois se tornou algo recorrente. Eu tenho certeza de que minha avó nunca soube de nada disso.”

Sua iniciação na prostituição se deu forma quase que natural, já que ela ia da escola pra casa sozinha e sempre avistava prostitutas com roupas brilhosas na rua. Curiosa, ela qustionou a avó sobre o que elas faziam. “Elas tiram a calcinha e os homens lhe dão dinheiro”, respondeu a avó. “Lembro de dizer para mim mesma: ‘Eu provavelmente vou fazer isso, porque os homens já estão tirando minha calcinha'”, relembra Brenda.

No início dos anos 70, ela largou a escola e disse que se tornou uma menina que não sabia dizer “não”. “Se os garotos do bairro dissessem que gostavam de mim ou me tratassem bem, eles conseguiam o que queriam comigo.”

Com isso, aos 14 anos ela já tinha duas filhas e era pressionada pela avó pra ajudar a sustentar as crianças. Foi assim que ela iniciou seu trabalho na prostituição. “Coloquei um conjunto de saia e blusa de US$ 3,99, um sapato de plástico barato e um batom laranja que eu achava que me fazia parecer mais velha. Chorei o tempo todo”, conta ela que conseguiu U$ 400 em uma única noite ao sair com cinco homens que, segundo ela, sabiam que ela era nova no ramo e pareciam ficar ainda mais excitados com isso.

Brenda-Myers-Powell-e-kim-longinotto (Foto: Getty Images)

E foi assim no final de semana seguinte. O que ela não imaginava era que no terceiro dia dois homens a colocariam no porta-malas de um carro e depois de estuprá-la em um lugar afastado a trancariam dentro de um armário num quarto de hotel.

Eles só a deixaram sair depois de muita súplica e com uma condição: que Brenda trabalhasse pra eles. Ela o fez durante seis meses e toda vez que tantava fugir, era recapturada e espancada. Mas o pesadelo dos cafetões não acabou por aí. “Depois, fui traficada pra outro homem. O abuso físico era terrível, mas o abuso mental era pior – as coisas que eles diziam não dá pra esquecer.”

Ela ainda alerta sobre a prostituição acabar sendo glamourizada algumas vezes. “Uma prostituta às vezes dorme com cinco estranhos por dia. No fim do ano, são 1.800 homens com quem ela teve relações sexuais. Não são relacionamentos, ninguém te traz flores, acredite em mim. Eles usavam meu corpo como um banheiro.”

A violência sofrida por Brenda através de seus clientes é algo que ela dificilmente irá esquecer. “E os clientes são violentos. Tomei cinco tiros, fui esfaqueada 13 vezes. Não sei por que esses homens me atacavam”, diz ela que se considera por ainda estar viva. “Conheci lindas garotas que foram assassinadas.”

Em 1997 ela passou por mais uma situação horrível: ao ser jogada pra fora de um carro por um cliente, seu vestido ficou preso na porta. “Fui arrastada por seis quarteirões e tive a pele do meu rosto e da lateral do meu corpo arrancada.” Ao chegar no hospital e ser identificada como prostituta por um policial, ela foi deixada na sala de espera pelas enfermeiras.

Um médico, no entanto, foi atencioso e a encaminhou pra Genesis House, um local dirigido por uma ingleas chamada Edwina Gateley, que a acolheu. “Ela me disse pra eu ficar tranquila e que eu podia morar lá pelo tempo que quisesse. Fiquei dois anos. Meu rosto sarou, minha alma se curou.”

Ao sair da Genesis, Brenda foi trabalhar como voluntária em uma pesquisa universitária com prostitutas em campo. Durante este trabalho ela perceeu que ninguém estava ajudando essas meninas a evoluir e então fundou, em 2008, ao lado de Stephanie Daniels-Wilson, a Dreamcatcher Foundation. “Vamos ao encontro dessas mulheres e dizemos: ‘Há um caminho, estamos aqui pra ajudar. E tentamos tirar da cabeça delas a ideia de que não há alternativas pra elas’.”

Um documentário, dirigido por Kim Longinottowill, sobre o trabalho de Brenda e sua fundção foi produzido e deve ir ao ar no Reino Unido em outubro.